A rosa

Ele não sabia que as rosas picavam. Já as tinha visto na varanda dos avós, num pequeno vaso de barro, vermelhas, brancas e amarelas, já as tinha cheirado até, Estranho, elas cheiram à minha mãe, mas nunca se atrevera a tocar-lhes, pareciam tão perfeitas, tão frágeis para se misturarem com a pele suja dos homens, A mãe diz que não posso cheirar os manjericos para não lhes roubar o perfume, e se eu tocar na rosa e lhe roubar a cor? ou a forma? não, não quero fazer isso. Os dias passavam e o fascínio do menino pelas flores do vaso de barro era cada vez maior, estava obcecado, apaixonado diriam as mentes mais românticas, tinha de lhes tocar, tinha de saber o que existia depois. Um dia ganhou coragem. Inspirou fundo, fechou os olhos, sentiu o perfume da mãe nas suas curiosas narinas, Um, dois, três, bradou um auch! incrédulo. Tinha imaginado tudo, a cor das pétalas a regar a terra seca, o caule a vergar-se lentamente, despedindo-se do sol com uma última vénia, com sorte mantinham-se iguais na sua beleza impenetrável, mas não aquilo. Subestimara as flores do vaso de barro e magoara-se. Pela primeira vez, o menino descobriu que as rosas picavam.

2 comentários:

  1. isto é tão flashbacks de josé luís peixoto. lê lê. que bom.

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  2. Nunca li, mas hei de acrescentar à minha lista de espera. Algum livro particularmente bom para começar?

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